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Mieloma múltiplo recidivado: qual o melhor tratamento?

Novos medicamentos ampliam a gama de opções de controle da doença. A estratégia terapêutica deve ser individualizada, considerando as características do paciente e das células tumorais.

O mieloma múltiplo é uma doença cada vez mais controlável. Como ainda não tem cura, mesmo com o transplante de medula óssea, a grande maioria dos pacientes precisa lidar com a recidiva, ou seja, o retorno ou recaída da doença. Após o tratamento e depois de algum tempo sob controle, as células tumorais voltam a ser produzidas.

O mieloma múltiplo é o segundo tipo mais comum de tumores do sangue. Ele se caracteriza pela produção anormal de plasmócitos, tipo de glóbulo branco gerado na medula óssea e que é responsável pela produção dos anticorpos que combatem vírus e bactérias. O plasmócito doente não produz anticorpos, mas uma proteína doente que não realiza a defesa e só prejudica o paciente, podendo levar a problemas renais, dentre outros.

Para definir a estratégia terapêutica a ser adotada a primeira pergunta a ser feita é se o paciente precisará ser tratado imediatamente ou não. Alguns tipos de recaída (em que só há alteração leve das proteínas doentes) devem ser apenas acompanhados, pois não prejudicam o paciente, permitindo, dessa forma, poupá-lo da toxicidade do tratamento. Alguns permanecem até mais de um ano sem ter que reiniciar o tratamento. Mas somente o médico pode identificar qual tipo de recaída o paciente apresenta.

Para aqueles que necessitam ser tratados, algumas questões-chave devem ser respondidas. Quanto tempo demorou para ocorrer a recaída após a terapia e qual foi a resposta ao último tratamento? Como se deu a recaída (na medula óssea ou fora dela e se foi devagar ou rapidamente), qual a agressividade e quais as características genéticas do tumor? Quais os níveis de toxicidade e efeitos colaterais das medicações usadas anteriormente?

Além disso, o médico tem que considerar o perfil de cada paciente e observar fatores como comorbidades (presença de outras doenças), dificuldade de mobilidade, distância do centro de tratamento e forma mais adequada de administração dos medicamentos, entre outros. É necessário, ainda, avaliar as possibilidades de acesso do paciente aos novos tratamentos. Com base nessas informações, o profissional de saúde pode adaptar de forma mais assertiva a estratégia terapêutica, visando sempre assegurar a adesão ao tratamento, ou seja, que o paciente use corretamente as medicações e venha regularmente para as consultas.

A meta é estender o tempo
Com o desenvolvimento de novos medicamentos, o desafio da Medicina atualmente é aumentar o intervalo entre o tempo que a doença está sob controle e a recidiva, que é um quadro habitual e bem conhecido pelos especialistas. Esse tempo não tem como ser previsto e depende de inúmeros fatores. Infelizmente, são poucos os casos em que a doença nunca volta.

Quando o paciente apresenta uma recaída ainda durante a vigência do tratamento, este deve necessariamente ser trocado. Se a recidiva ocorre com um intervalo maior é até possível considerar a reedição da mesma estratégia terapêutica. Porém, com a disponibilidade crescente de medicamentos novos e mais efetivos, cada vez menos os médicos optam por repetir a escolha anterior.

Comumente tem se optado por realizar tratamento de maneira contínua, sem interrupções, até que a doença retorne, tendo em vista os excelentes resultados para controle da enfermidade. Entretanto, isso se aplica apenas a alguns tipos de tratamento mais modernos, que são menos tóxicos que os anteriores.

Opções à disposição
De forma geral, o mieloma múltiplo é tratado com quimioterápicos, com novos medicamentos não quimioterápicos e, em alguns casos específicos, com radioterapia. O transplante de medula óssea é destinado para pessoas com até 75 anos, em bom estado clínico e que tenham apresentado boa resposta ao tratamento. Ele aprofunda a intensidade da resposta e ajuda a aumentar o tempo sem a doença. Cerca de 30% a 40% dos pacientes com a doença são transplantados. O transplante usado no mieloma múltiplo é o autólogo, ou seja, da própria medula do paciente. O transplante alogênico, que é recebido de um doador familiar ou não, é muito mais tóxico e, por isso, somente adotado em casos extremamente raros.

As intervenções medicamentosas vêm, cada vez mais, se consolidando como as preferenciais, tanto em razão do aperfeiçoamento dos quimioterápicos, como pelo desenvolvimento de novas classes de remédios com maior eficácia e menor toxicidade. Entre eles, destacam-se os inibidores de proteassoma, substância bastante ativa nas células do mieloma; os imunomoduladores, que agem no sistema imunológico estimulando a destruição das células doentes; e os anticorpos monoclonais, proteínas produzidas em laboratório com o objetivo de agir em um alvo molecular específico das células tumorais. Há, ainda, outros tipos de tratamento aprovados em outros países que não chegaram ainda ao Brasil, além de diversos em desenvolvimento.

Todas essas famílias de medicamentos podem ser adotadas de forma combinada e apresentam diversas formas de administração (via oral, aplicação na veia ou subcutânea). Alguns têm mais eficácia sobre determinados tipos de mieloma, outros são mais indicados para casos mais recentes ou para pacientes com várias recaídas. Assim, os médicos contam com um leque diversificado de combinações possíveis para cada caso, visando chegar a esquemas medicamentosos cada vez mais eficientes e menos tóxicos. No caso do mieloma múltiplo vale uma regra de ouro: os melhores tratamentos, os mais eficazes, devem ser usados o quanto antes, preferencialmente assim que o paciente é diagnosticado. Não devem ser “guardados” para depois, pois reduzem muito a eficácia.

Além disso, têm surgido opções que prometem revolucionar o tratamento da doença, como a nova geração de anticorpos fabricados em laboratório e medicamentos que aumentam alguns mecanismos para a morte celular. Há, ainda, uma moderna tecnologia terapêutica chamada de CAR-T Cell, que envolve a extração dos linfócitos do próprio paciente para serem geneticamente modificados em laboratório e ‘treinados’ para reconhecer os plasmócitos doentes como corpos estranhos ao organismo. Depois disso, são multiplicados no próprio laboratório e devolvidos ao paciente diretamente pela veia para combater e eliminar as células doentes. As CAR-T Cells ainda não estão disponíveis no Brasil, mas a BP, que é uma instituição de referência nessa especialidade médica, está se organizando para trazer essa tecnologia em breve. Essas novas frentes podem representar caminhos que, um dia, podem levar à cura do mieloma.

Até os anos 1990, a expectativa de vida de um paciente com mieloma múltiplo era de dois ou três anos. Com o expressivo desenvolvimento terapêutico observado nas últimas décadas, esse tempo saltou para 10 anos ou mais, um marco considerável para uma doença que afeta particularmente as pessoas com mais idade, geralmente na faixa de 65 anos. Hoje, com um bom controle da doença, muitos falecem após muitos anos por causas naturais e não pelo mieloma múltiplo, que permanece sob controle. Isso é um ganho para a quantidade e qualidade de vida, comprovando que a Medicina avança a passos largos para tornar o mieloma múltiplo uma doença crônica, como são a hipertensão e o diabetes. Ou seja, um tratamento em longo prazo em que o paciente consegue exercer normalmente a maioria de suas atividades.

Toda essa complexidade da doença reforça a importância de buscar cuidados em centros superespecializados, como a BP, com médicos e equipe multiprofissional capazes de avaliar por completo o caso de cada paciente, estabelecendo estratégias de tratamento individualizadas, tanto nas fases precoces da doença como na recidiva do mieloma múltiplo.

Fonte: Breno Moreno de Gusmão – CRM 166.471 SP; Danielle Leão Cordeiro de Farias – CRM 94.841 SP

Data da última atualização: 16/7/2021