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Anemia aplástica severa ganha novo padrão de tratamento medicamentoso capaz de impactar a vida dos pacientes

A BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo já tem pacientes em tratamento com a nova terapia. Estudo com o uso da droga eltrombopague associada a imunossupressão foi publicado hoje no NEJM

Publicado em 6 de janeiro de 2022

Após 30 anos, o tratamento de anemia aplástica severa, uma doença rara que prejudica o funcionamento da medula óssea e impede que o organismo produza a quantidade adequada de novas células sanguíneas, acaba de ganhar um novo padrão de tratamento medicamentoso capaz de impactar a vida dos pacientes. Um estudo independente, conduzido pelo principal grupo de hematologia da Europa, foi publicado nesta quinta-feira, dia 6 de janeiro, no New England Journal of Medicine (NEJM), uma das publicações científicas mais importantes do mundo, indicando a associação da droga eltrombopague junto com a terapia imunossupressora, com resultados que se mostraram altamente eficazes.

 

O médico Phillip Scheinberg, coordenador da Hematologia do Centro de Oncologia e Hematologia da BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo, e um dos principais pesquisadores sobre novos tratamentos da doença no mundo, redigiu o editorial da pesquisa. Ele lembra que a última vez que o padrão de tratamento da anemia aplástica sofreu mudanças foi em 1991, após estudo publicado no mesmo NEJM, quando se passou a adotar o uso de duas drogas imunossupressoras ao invés de uma. O especialista, que protagonizou vários dessas pesquisas, explica: “Após esse período, apesar de inúmeros estudos e protocolos desenvolvidos, nada se mostrou superior ao uso de duas drogas. Por isso esse novo estudo com a associação da terapia imunossupressora com o eltrombopague é bastante relevante e estabelece um novo padrão no tratamento medicamentoso da doença”.

 

A anemia aplástica atinge hoje cerca de 1.000 pessoas no Brasil, na maioria jovens adultos na faixa etária entre 15 e 35 anos. De acordo com o médico, há dois tratamentos principais para a doença: o transplante de medula óssea ou a terapia imunossupressora. E é justamente nesta segunda modalidade que as pesquisas vêm sendo mais focadas, com o desenvolvimento de protocolos e trabalhos em diversas partes do mundo. “A grande maioria dos pacientes diagnosticados com a anemia aplástica severa no mundo não são tratados com transplante de medula óssea devido a ausência de um doador compatível, comorbidades, idade avançada, inacesso ao transplante ou preferência do paciente”, comenta o médico.

 

A terapia imunossopressora é constituída pelo uso de drogas que suprimem o sistema imune. A nova pesquisa inclui à terapia mais uma droga, o eltrombopague, que estimula a medula óssea a produzir mais sangue. “Tirando a pressão da medula pelo sistema imune e a estimulando, conseguimos que os pacientes respondam de uma forma mais robusta e rápida ao tratamento”, explica Phillip.

 

No estudo “A New Standard Immunosuppression Regimen in Severe Aplastic Anemia” foram avaliados 197 pacientes, divididos em dois grupos, que receberam o sistema duplo (ATG e ciclosporina) e triplo de drogas (ATG, ciclosporina e eltrombopague), respectivamente. Em 2 anos, a sobrevida livre de eventos foi de 34% no Grupo A e 46% no Grupo B.

 

Europa x Mundo

 

Os primeiros estudos com o eltrombopague foram publicados em 2012, nos Estados Unidos, em pacientes não respondedores a terapia inicial; e, em 2017, surgiram as primeiras associações do eltrombopague com a terapia imunossupressora em primeira linha em um estudo de braço único, que foi comparado a um grupo histórico de forma rigorosa. O médico da BP participou no desenvolvimento dos estudos do eltrombopague na anemia aplástica severa iniciado há mais de 10 anos e aparece com um dos principais autores nas publicações no New England Journal of Medicine em 2012 e 2017.

 

As pesquisas randomizadas, comparando o regime de imunossupressão dupla com o esquema tríplice (usando três drogas), ocorreram entre 2015 e 2019 e foram aprovadas em diversos locais como Estados Unidos, América Latina, Ásia, entre outros. No Brasil, a associação da droga com a terapia imunossupressora foi aprovada em março de 2020 pela Anvisa.

 

O contraponto ocorreu justamente na Europa, onde a pesquisa foi desenvolvida. A EMA (European Medicines Agency), a agência regulatória europeia de medicamentos, negou o uso das três drogas como tratamento de primeira linha para a anemia aplástica rara.

 

O estudo “A New Standard Immunosuppression Regimen in Severe Aplastic Anemia”, publicado agora no NEJM, foi apresentado no Congresso Europeu de Transplante de Medula Óssea (EBMT) em outubro de 2020, ganhando o prêmio Van Bekkum Award. “É um grande avanço que já está sendo usado em grandes centros de referência de hematologia do mundo, como a BP. Espero que não demore mais 30 anos para termos novas evoluções para combater a anemia aplástica”, finaliza o médico.