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Avanços terapêuticos aperfeiçoam o controle das epilepsias

Novos recursos estão garantindo mais saúde e qualidade de vida para os pacientes que precisam evitar crises epiléticas.

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Novos medicamentos e o aperfeiçoamento das tecnologias terapêuticas buscam aumentar o controle das epilepsias, distúrbios químicos e elétricos que afetam o cérebro, tornando as células nervosas superexcitáveis. Quando esses distúrbios ocorrem, similares a um curto-circuito, provocam convulsões que, na maioria das vezes, são temporárias, mas que tendem a se repetir periodicamente. Impedir crises epiléticas é fundamental, pois elas podem causar lesões traumáticas no cérebro que comprometem funções cerebrais e até morte súbita.

Base para o controle das crises epilépticas em cerca de 70% dos pacientes, o tratamento com medicamentos vem ganhando novas opções. Apesar de não serem mais eficazes que as medicações já estabelecidas, como fenitoína, hidantal e fenobarbital, eles geram menos efeitos colaterais. No Brasil, deve ser lançado em breve o briverecetam, evolução criada a partir de uma molécula já conhecida, a levetiracetam, um inibidor de neurotransmissores. Sua grande vantagem é a possibilidade de formulações para consumo oral, uma carência no mundo das medicações anticrises. Também existe versão endovenosa.

Canabidiol

Outro avanço está relacionado aos medicamentos que utilizam o canabidiol e seus derivados (substâncias extraídas da maconha) associados a outros fármacos. Fabricados em laboratórios, esses remédios não contêm THC (tetrahidrocanabinol), o que significa que eles não têm efeito psicoativo gerado pelo uso da planta. Sua utilização é estritamente medicinal e segura para adultos e crianças.

Remédios do gênero, ainda não disponíveis no SUS, também não são superiores aos medicamentos classicamente utilizados para controlar a epilepsia, mas ampliam a gama de opções, beneficiando alguns perfis de pacientes e outros não. Eles agem particularmente sobre sintomas psiquiátricos, como transtornos de ansiedade e depressão, além de melhorar o sono. Aqui, cabe um alerta importante: apesar de a maconha ser fonte de canabidiol, o THC existente nessa erva é pró-epilético, ou seja, fumar maconha pode ser um gatilho para crises.

Cirurgia e neuromodulação

Para pacientes nos quais o tratamento com medicamentos anticrise não surte o efeito desejado, a boa notícia são os avanços nas abordagens alternativas: a cirurgia para retirada das áreas cerebrais associadas aos distúrbios e os procedimentos de neuromodulação, baseados na instalação de dispositivos que emitem impulsos elétricos que ajudam a prevenir as crises. Essas abordagens não substituem as medicações, que continuam a ser prescritas em dosagens mais baixas.

As cirurgias vêm se beneficiando dos avanços tecnológicos, como os microscópios cirúrgicos, vitais para os procedimentos neurológicos invasivos. Com maior capacidade de aumento e precisão das imagens, eles contribuem para cirurgias mais seguras e efetivas.

Soma-se a isso, a evolução contínua dos exames de imagem, que estão sendo cada vez mais usados associados a técnicas anatômicas e funcionais para a localização exata dos pontos geradores das crises. Isso é essencial para a remoção (ressecção) das áreas causadoras de distúrbios, preservando ao máximo tecidos e estruturas saudáveis adjacentes.

Outro trunfo, que só centros de referência como a BP oferecem, é a eletroencefalografia com crânio aberto. O procedimento, que envolve a fixação de eletrodos para registrar as descargas elétricas em várias partes do cérebro, aumenta a precisão das cirurgias.

Estimulação do nervo vago

Progressos também ocorreram nas técnicas de neuromodulação. Usada com mais frequência no Brasil há cerca de uma década, a estimulação no nervo vago (que controla funções involuntárias do corpo) se baseia na emissão de sinais elétricos a partir de um eletrodo implantado no cérebro. A técnica vem se desenvolvendo com o aprimoramento dos dispositivos microeletrônicos que fazem o sistema de neuromodulação funcionar. O mesmo ocorre com os marca-passos de estimulação cerebral profunda, o Deep Brain Stimulation (DBS), outro recurso usado em epilepsias de difícil controle.

Além dessas técnicas invasivas (métodos nos quais os dispositivos precisam ser colocados dentro do corpo do paciente, exigindo periodicamente a troca de baterias dos dispositivos), soluções não invasivas continuam sendo testadas. Uma delas é a estimulação elétrica transcraniana, na qual a geração dos sinais elétricos é feita por um aparelho do lado de fora do crânio.

Dieta cetogênica

Outro recurso no enfrentamento das crises epiléticas é a dieta cetogênica, baseada no consumo de alto teor de gordura e baixo carboidrato e proteína, a fim de induzir o corpo ao chamado estado cetônico, uma espécie de estado de jejum em que o corpo transforma gordura e proteína em fonte de energia. Os benefícios dessa dieta para pacientes com epilepsias já eram conhecidos desde a antiguidade, tendo sido demonstrados cientificamente no início do século 20.

Atualmente, a hipótese científica para explicar a relação entre essa dieta e epilepsia seria que nesse estado cetogênico ocorre aumento da produção de neurotransmissores inibidores de crises. A despeito da validade ou não dessa explicação, estudos demonstram que para alguns tipos de epilepsia, especialmente as não brandas, a dieta mostra-se capaz de controlar as crises quando conjugada com os medicamentos. Difíceis de serem executadas, dietas do gênero demandam suporte especializado de nutricionista ou nutrólogo.

Mesmo com tantos avanços, ainda não é possível falar em cura da epilepsia. Mas são progressos importantes para que os pacientes tenham as crises bem controladas, impedindo que elas impactem negativamente sua qualidade de vida.

Fonte: Marcelo Freitas Schmid - CRM/SP 165.433

Data de produção: 21/10/2022

Data da última atualização: 07/11/2022