Apesar de sua comercialização ser proibida no Brasil desde 2009, o uso do cigarro eletrônico, aparelhos nos quais soluções líquidas são aquecidas por baterias elétricas produzindo vapor/aerossol inalado pelo usuário, têm crescido no país, sustentado por inverdades que precisam ser esclarecidas.
Do ponto de vista da saúde pública, esses dispositivos, também conhecidos como vape, foram desenvolvidos para ajudar as pessoas a abandonar o cigarro convencional, porém, como um verdadeiro Cavalo de Troia, essas versões eletrônicas têm levado milhares de jovens de todo o mundo ao vício, enquanto são vendidas indevidamente como uma solução terapêutica aos fumantes.
Só nos Estados Unidos, 50% dos adolescentes do país disseram já ter tido algum contato com esse dispositivo, que se torna uma potencial porta de entrada ao tabagismo, prática que retira de 7 a 8 anos de vida de uma pessoa por conta dos efeitos deletérios que se acumulam ao longo dos anos de fumo. Entre eles, estão os cânceres do pulmão e em outros órgãos e a aceleração de doenças ateroscleróticas devido ao processo de envelhecimento precoce dos vasos sanguíneos.
Além de não haver dados científicos conclusivos que garantam que os cigarros eletrônicos são menos danosos à saúde que o cigarro comum em longo prazo, já se sabe que, em curto prazo, eles são piores que os convencionais, uma vez que podem provocar a EVALI*, doença pulmonar potencialmente grave derivada de processos inflamatórios ocasionados pela aspiração das substâncias emitidas por esses dispositivos. Evidências científicas já foram descritas na literatura internacional e nacional, inclusive casos de pacientes tratados na BP.
Agrupados entre os Dispositivos Eletrônicos para Fumar (DEFs), os cigarros eletrônicos levam na sua solução líquida, que é aquecida eletronicamente, propilenoglicol e glicerina, podendo conter ou não nicotina, além dos mais variados tipos de essências que dão sabor e aroma. Quando elevados a altas temperaturas, esses elementos geram partículas estranhas ao organismo e, ao serem filtradas pelos pulmões, podem desencadear reações no sistema imunológico local que redundam em inflamações no tecido pulmonar. Ou seja, o combate a essas substâncias provenientes do cigarro eletrônico pode lesar os pulmões, causando sintomas como falta de ar, tosse e cansaço, que nos casos mais graves ocorre até em repouso.
Nem propilenoglicol, glicerina, nicotina e essências são em si carcinogênicos, ou seja, não são elementos que provocam o câncer. Contudo, uma vez aquecidos, os subprodutos que geram têm, sim, potencial de provocar o desenvolvimento de tumores. Outro aspecto a considerar é que, como a produção e a comercialização dos cigarros eletrônicos são proibidas no Brasil, é preciso levar em conta que não há controle de qualidade desses dispositivos eletrônicos e tampouco segurança sobre os tipos, qualidade e quantidade dos componentes químicos presentes no produto.
Em relação à nicotina especificamente, é importe lembrar que essa substância causa dependência. Ou seja, a pessoa que nunca fumou o cigarro convencional pode ficar dependente da nicotina via o cigarro eletrônico e, em questão de anos, tornar-se um fumante convencional.
Frente a essa moda propagandeada na internet e nas redes sociais, resta a todos o desafio de superá-la. Para aqueles que já se tornaram dependentes da nicotina, recomenda-se buscar os programas de antitabagismo disponíveis para os fumantes do tabaco convencional. Para os que não usam nicotina, mas já transformaram o cigarro eletrônico em muleta ou gatilho de processos psicológicos específicos, é indicado o suporte de terapia cognitivo-comportamental.
* EVALI: sigla em inglês para lesão pulmonar associada ao uso de produtos de cigarro eletrônico ou vaping (E-cigarette or Vaping product use-Associated Lung Injury)
Fonte: Felipe Marques da Costa - CRM/SP 154.120
Data de produção: 31/08/2022
Data da última atualização: 05/09/22